segunda-feira, 23 de abril de 2012

A Teologia Paulina da Cruz (Novos Paradigmas)


  
A cruz é a nossa única Teologia


Paulo nos quer dizer que não podemos fazer nada para merecer a salvação. E, se não entendemos isso, não entendemos nada do Evangelho. Verificando as epístolas de Paulo, porém, apenas três abordam a questão da gratuidade da graça e da justificação pela fé: Gálatas, Filipenses e Romanos.
O conceito-chave do pensamento Paulino, se concretiza diversamente em função das problemáticas encontradas e das culturas dos destinatários das cartas, mas que é central para todas as epístolas: aquilo que eu chamo de teologia da cruz. A cruz de Jesus, que morre como um homem sem qualquer qualificação perante a lei torna-se o princípio de inteligibilidade do cristianismo.
A teologia Paulina da cruz fica mais densa em I Coríntios 1, 18-25, onde se lê: A linguagem da cruz é loucura para aqueles que se perdem. Mas, para aqueles que se salvam, para nós, é poder de Deus. Essa loucura, esse absurdo, ou seja, a cruz se atravessa em um imaginário de Deus como onipotente.
Paulo propõe justamente que se abandonem as categorias teológicas de onipotência para aceitar as manifestações inimagináveis e paradoxais de Deus.
A cruz é a nossa única teologia. De certa forma, a linguagem de Paulo vem crucificar, portanto, as nossas imagens anteriores de Deus. Em Jesus, a força de Deus se manifesta na sua extrema fragilidade.
Para Paulo, todos são gratuitamente justificados pela graça. Portanto, para o pensamento Paulino, não há um laço entre dar e receber a salvação. A fé é recepção gratuita, ato de confiança, não depende da peregrinação ou do desempenho do fiel.
Dois autores sagrados afirmam a teologia enfocada na cruz: de um lado, o evangelista Marcos e, do outro, Paulo. Paulo expressa pela argumentação, através de um discurso argumentativo, o que Marcos, por sua vez, interpreta em uma narrativa, isto é, utilizando o modo narrativo. O que os reúne é o fato de que, tanto para um como para outro, a verdade de Cristo, e bem mais a verdade do Cristianismo, só se expressa na cruz.
É nesse momento, então, que se manifesta a necessidade de espiritualidade. É preciso que os cristãos tenham nesse momento uma linguagem verdadeira, e esta linguagem verdadeira é a de um Cristianismo voltado não para uma cruz dolorista, mas para uma cruz promessa de vida ligada àquele que vive seu sofrimento com a convicção de que Deus o impulsiona para a vida.
Portanto, existe uma necessidade de espiritualidade evidente que não é menor do que a de antes, com a diferença de que o público desconfia de fórmulas prontas, o que eu chamo de fórmulas do catecismo, fórmulas doutrinárias que não se orientam para a existência.
E para isso, de fato, é preciso voltar à Escritura, porque é assim que aprendemos a despojar nossa linguagem das fórmulas calcadas, dos slogans, para seguirmos o percurso de vida de pessoas que podem atestar a presença de Deus que as acompanha.

+Dom Eduardo Rocha Quintella
Bispo Diocese de Belo Horizonte

sexta-feira, 20 de abril de 2012

III Domingo da Páscoa (Lc 24, 35- 43) Ano B – 22/04/2012




É preciso ver o extraordinário nas coisas ordinárias.
Nós nascemos na Igreja e nutrimos nossa fé na Igreja. Não existe cristão que vive isolado, no mundo, individualizado numa religião ao seu modo. O cristão precisa da Igreja. Na Igreja ele é acolhido pelo Ressuscitado, que indica onde encontrar a vida em abundância e lhe prepara um alimento renovador das forças.
           É deste modo que acolhemos Jesus que vem ao encontro de seus discípulos para alimentá-los com sua Palavra e com um alimento preparado por ele próprio. Uma típica alusão aos sacramentos, especialmente à Eucaristia, destacando a presença de Jesus ressuscitado na Palavra e nos símbolos sacramentais.
Da mesma forma, o Senhor vem ao encontro dos discípulos, de todos os tempos, na vida cotidiana, manifestando-se especialmente naqueles que ouvem sua Palavra, a obedecem e lançam a rede onde possam pescar vida abundante.
Como Cristo apareceu aos discípulos de emaús, também aparece na nossa vida. O único obstáculo seria o estarmos sem os olhos da fé. Torna-se difícil reconhecê-Lo quando estamos preocupados demais com nós mesmos, com as pequenezes da vida, com a rotina da vida quotidiana. A vida presente tem um significado muito mais profundo, nos lança à Vida Eterna.
É preciso ver o extraordinário nas coisas ordinárias. Temos que dar testemunho daquilo que experimentamos graças aos olhos da fé, que o mundo não reconhece e que só a fé revela: Cristo ressuscitou. Ele vive e nos precede junto de Deus. Há tantos cegos que não enxergam por culpa do seu egoísmo e sensualidade, soberba e avareza...
Ajudemos nossos irmãos a encontrarem os olhos da fé, que Cristo traz com a Sua Ressurreição. Vivamos com cara de ressuscitados. Neste domingo, façamos o propósito de abrir o nosso coração. Para isso devemos esvaziá-lo de nós mesmos e implorar a Deus que entre, para que o seu Espírito nos transforme em pessoas ressuscitadas.

Dom Eduardo Rocha Quintella
Bispo Diocese Belo Horizonte

sábado, 14 de abril de 2012

II Domingo da Páscoa Ano - B – 15/04/2012 (Jo 20, 19-31)




O Jesus Ressuscitado não é encontrado na paz das igrejas

A liturgia desse domingo, vivendo ainda a alegria pascal, apresenta a nova comunidade (a Igreja), que nasce da cruz e Ressurreição com a missão de revelar aos homens a Vida Nova que brota da Ressurreição. Uma comunidade que dá testemunho, provocando admiração e simpatia do povo e atraindo novos membros.
O Tempo Pascal caracteriza-se como tempo, no qual o Espírito Santo conduz sua Igreja ao testemunho concreto da fé, através da partilha fraterna, da alegria e da paz. A celebração deste Domingo demonstra que a fé não é algo teórico ou intimista, pois esta se manifesta concretamente em nossas comunidades e na vida dos discípulos e discípulas de Jesus.
Talvez esta seja a mensagem central do Evangelho deste segundo domingo de Páscoa. O Jesus Ressuscitado não é encontrado na paz das igrejas. Devemos sair ao fundo deste mundo. Devemos colocar as mãos nas feridas da história. Devemos nos aproximar dos que lhes tocou a pior parte, aos pobres, aos marginalizados de todo tipo, aos que sofrem por qualquer razão.
Aí, tocando a cruz, que podemos sentir, é como nos encontramos com o Senhor Ressuscitado, com o Jesus ao qual o Pai devolveu a vida. Indo aos lugares mais escuros da história, onde o pecado, a dor e a morte estão demasiados presentes, onde não cabe a esperança, é como encontraremos ao que é a fonte de toda esperança, ao que nos faz olhar para além da morte, com uma perspectiva que não é a dos homens senão a perspectiva de Deus.
Sentindo todos os homens e mulheres como irmãos e irmãs no coração, seremos capazes de recriar aquela comunidade primeira na qual, todos viviam unidos e tinham tudo em comum. As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo.
E aí precisamente onde experimentamos a Jesus Ressuscitado e escutamos uma vez mais sua voz, que nos enche de esperança: A paz esteja convosco.

+Dom Eduardo Rocha Quintella
Bispo Diocese Belo Horizonte